VP jurídico Felipe Carregal fala sobre atraso do balanço e faz críticas: ‘O Vasco foi abandonado na transição do futebol para a SAF’ Quinta-feira, 02/05/2024 – 08:40 O Vasco ainda não publicou o balanço de 2023 do clube associativo. O prazo previsto na Lei Geral do Esporte impõe o dia 30 de abril para a divulgação dos demonstrativos financeiros. O atraso implica em possíveis penalidades para o presidente Pedrinho.
O ge entrou em contato com a gestão do presidente Pedrinho, que responsabilizou o grupo de Jorge Salgado por diminuir o número de funcionários do financeiro do clube. Abaixo na matéria, a entrevista completa com Felipe Carregal, vice-presidente jurídico do Vasco, na qual ele justificou o atraso e disse que não teme punições.
O atraso da gestão Pedrinho
A antiga Lei Pelé foi absorvida pela Lei Geral do Esporte, mas manteve a sujeição a penalidades para as instituições desportivas que não cumprem com o prazo obrigatório – assim como fez a SAF. Desde 1998, a legislação brasileira prevê obrigações contábeis de ligas desportivas, entidades e clubes. Em caso de não cumprimento, há possibilidade até de afastamento de presidente.
Em nota (veja ao fim da reportagem) nas redes sociais do clube associativo, a direção do Vasco comunicou o atraso na publicação dos balanços e responsabilizou a gestão de Jorge Salgado, ex-presidente, pela redução do número de funcionários do departamento financeiro do clube – o que na visão da gestão de Pedrinho teria dificultado a obtenção de informações e documentações para elaboração do balanço.
Salgado respondeu às alegações da diretoria de Pedrinho e disse que “não pode concordar com a triste tentativa de se criar uma narrativa irreal para transferência de responsabilidades”. Veja a resposta de Salgado mais abaixo também.
O ex-presidente já havia rebatido ao ge as informações publicadas na semana passada, sobre levantamento de dívidas da atual gestão do associativo – subindo para cerca de R$ 200 milhões após classificações de ações ainda em discussão na Justiça.
Em comunicado, Salgado dizia que causaria “espanto” se a gestão Pedrinho transformasse as contingências – que podem ser revertidas na Justiça ou depois quitadas com descontos ou em acordos – em dívidas nas demonstrações financeiras de 2023.
Em 2014, Dinamite também não respeitou prazo
A administração de Pedrinho repete, 10 anos depois, procedimento da gestão de Roberto Dinamite. No fim de abril de 2014, em ano de eleição presidencial que confirmaria a volta de Eurico Miranda ao Vasco, a diretoria vascaína também atrasou a publicação do balanço e o entregou fora do prazo.
Na ocasião, a gestão Dinamite tentava fazer ajustes nos balancetes de 2012, que não haviam sido aprovados no Conselho Deliberativo de São Januário. O balanço só foi publicado dois dias depois do prazo estipulado em lei e ainda sem auditoria externa, o que também foge à regra da legislação vigente, mas não houve consequências à administração do então presidente.
Leia o que diz a Lei Geral do Esporte no artigo 63, que trata até mesmo de afastamento dos dirigentes e da nulidade de todos os atos praticados por eles em nome da organização esportiva:
§ 2º As organizações esportivas que violarem o disposto neste artigo ficam ainda sujeitas:
I – ao afastamento de seus dirigentes; e
II – à nulidade de todos os atos praticados por seus dirigentes em nome da organização, após a prática da infração, respeitado o direito de terceiros de boa-fé.
§ 3º Para fins de aplicação do § 2º deste artigo, consideram-se dirigentes:
I – o presidente da organização esportiva, ou aquele que lhe faça as vezes; e
II – o dirigente que cometeu a infração, ainda que por omissão.
Justificativa do associativo e críticas ao balanço da SAF
Leia a entrevista com Felipe Carregal, vice-presidente jurídico do CRVG.
ge: O Vasco comunicou que “a gestão Jorge Salgado reduziu drasticamente o departamento financeiro do clube após a migração do futebol para a Vasco SAF”. Pode explicar isto em números? Ou seja, quantos funcionários havia e quantos há hoje?
VP jurídico do Vasco: Sim, houve uma redução drástica. O Vasco tinha um diretor financeiro, um gerente financeiro, um funcionário de contas a pagas, outro de contas a receber, um contador chefe, um coordenador contábil, um analista de contabilidade e por aí vai. Toda essa equipe foi transferida para a SAF ou demitida. Todos os departamentos do clube sofreram essa redução. Hoje, por falta de receita, o Vasco não consegue contratar todo esse pessoal. A realidade é essa. O Vasco foi abandonado na transição do futebol para a SAF.
ge: O Vasco teme alguma penalidade pelo atraso da publicação do balanço?
VP jurídico do Vasco: Não. Não houve má-fé. O Vasco não está se negando a apresentar o balanço. Muito ao contrário, o clube se manifestou publicamente na terça, esclarecendo os motivos do atraso, ressaltando que a publicação ocorrerá dentro de um curto espaço de tempo, de alguns dias. Não era, nem de longe, o que gostaríamos.
ge: Noticiamos que o clube calculava adicionar à dívida contingências de cerca de 200 milhões de reais, o que foi contestado pelo ex-presidente Salgado. O que podem explicar sobre esse assunto?
VP jurídico do Vasco: Sobre os 200 milhões, estamos revendo todos os processos judiciais e reclassificando-os de acordo com a norma contábil (CPC 25), o que poderá impactar na provisão de contingências – e esse foi um dos problemas enfrentados por nós.
ge: Há previsão para a publicação?
VP jurídico do Vasco: Alguns dias. Estamos em contato diário com a auditoria e com os profissionais terceirizados que estão colaborando de forma muito proativa e técnica conosco. Só temos a agradecer a eles.
A nota publicada pelo Vasco
“O Club de Regatas Vasco da Gama comunica o atraso na publicação do balanço financeiro do clube, ano referência 2023, gestão Jorge Salgado. Gostaríamos de esclarecer os motivos que levaram a esta situação, visando a transparência e o respeito aos nossos sócios e torcedores.
A diretoria administrativa da gestão Jorge Salgado reduziu drasticamente o departamento financeiro do clube após a migração do futebol para a Vasco SAF, resultando na terceirização total de suas atividades financeiras e contábeis. Infelizmente, esta transição acarretou transtornos significativos para a obtenção de informações e documentações necessárias para a elaboração do balanço, tendo em vista que não houve, por parte da administração Jorge Salgado, a gestão diligente e efetiva nestes processos desde então. Além disso, a precariedade dos controles e processos internos do clube, especialmente no que se refere a administração dos passivos contingentes realizada pelos escritórios de advocacia terceirizados e à movimentação do conta corrente com a Vasco SAF, prejudicou imensamente a realização dos trabalhos.
Diante destes desafios e do inegociável compromisso com a qualidade e fidedignidade das informações, tornou-se impossível cumprir o prazo estabelecido para a publicação do balanço financeiro. Reconhecemos que este atraso é inaceitável e entendemos a importância da transparência e responsabilidade na divulgação das informações financeiras e contábeis.
Ressaltamos o compromisso em tomar as medidas necessárias para regularizar essa situação, reforçando os controles internos e promovendo as mudanças estruturais indispensáveis para garantir a eficiência e pontualidade nas futuras prestações de contas.
Pedimos desculpas pela inconveniência causada e reiteramos nosso comprometimento em fornecer, o mais brevemente possível, as informações financeiras completas e detalhadas que os nossos associados e torcedores merecem.
Agradecemos a compreensão de todos e reafirmamos nosso compromisso com a transparência e lisura na gestão do Club de Regatas Vasco da Gama.
Atenciosamente,
Diretoria Administrativa
Club de Regatas Vasco da Gama”.
A resposta de Jorge Salgado
“Tendo em vista o comunicado emitido na noite de ontem (30/4) pela atual Diretoria Administrativa do CRVG com as “justificativas” para a lamentável não publicação das Demonstrações Financeiras do clube no prazo legal, entendo que alguns esclarecimentos são necessários.
Primeiramente, não é correto culpar a gestão anterior por uma obrigação que é de exclusiva competência dos atuais administradores. Lembro que no primeiro ano de nossa gestão, mesmo no meio de uma pandemia, com a temporada do futebol de 2020 invadindo o início do ano de 2021, com a necessidade de realização de auditoria nas ações judiciais de natureza trabalhista, sem ter sido realizado processo de transição administrativa e com a nossa eleição ainda sendo contestada na justiça, apresentamos o balanço do último ano da gestão do presidente Campello no prazo.
Também é bom lembrar que a redução da estrutura administrativa do clube após a constituição do Vasco SAF foi precedida de estudos de consultoria externa especializada e implementada para adequar o clube à nova realidade sem a atividade do futebol. Foi essa nova estrutura que trabalhou para publicação do balanço do ano de 2022, rigorosamente no prazo, mesmo diante do desafio de refletir no balanço do CRVG os ajustes decorrentes da criação do Vasco SAF. Além disso, a estrutura atual do clube sem o futebol é muito menos complexa, com atribuições mais simples, o que facilita significativamente a elaboração das demonstrações financeiros.
Se o atraso na publicação do balanço foi decorrente da revisão de alguns conceitos contábeis tendo em vista os alertamentos feitos ontem por mim com relação à classificação de contingências e o conta-corrente CRVG/SAF, acho até positivo, uma vez que a boa prática contábil deve sempre prevalecer. Porém, não se pode concordar com a triste tentativa de se criar uma narrativa irreal para transferência de responsabilidades”.
Fonte: ge