Vegetti fala sobre o início da sua carreira, acidente dos pais, chegada ao Vasco e momento como capitão do time Quinta-feira, 25/07/2024 – 11:39 Pablo Vegetti nasceu numa vila chamada Santo Domingo, no estado de Santa Fe – a mais de 500 km da capital do país Buenos Aires. Uma cidadezinha que chama de “pueblo” de apenas 2,5 mil pessoas. É de lá que saiu o homem que mudou a história do Vasco em 2023. Fez 10 gols em 21 jogos e foi peça fundamental no time que escapou do rebaixamento na última rodada.
Abre Aspas: Vegetti relembra momentos da carreira, acidente dos pais e relação com o Vasco
Aos 35 anos, o “Pirata” vive situação inédita na carreira: tem status de ídolo num time de massa depois de trajetória periférica na vida de atleta. No Abre Aspas do ge – a entrevista foi realizada na segunda-feira (dia 15), após a vitória contra o Internacional, em Porto Alegre -, o atacante conta da dificuldade em sair de casa e do aspecto psicológico quase invisível que também explica essa trajetória incomum.
Vegetti Vasco Abre Aspas — Foto: André Durão |
Abre Aspas: Pablo Vegetti
Ficha técnica
- Nome completo: Pablo Ezequiel Vegetti Pfaffen
- Nascimento: Santo Domingo, na Argentina, em 15 de outubro de 1988
- Carreira: Villa San Carlos, Rangers de Talca (Chile), Ferro Carril, Gimnasia, Colón, Boca Unidos, Instituto, Belgrano e Vasco. Foi artilheiro das três principais divisões do campeonato argentino. Pelo Vasco, tem 24 gols em 51 jogos. Média de quase um gol a cada duas partidas.
- Título: Campeão da segunda divisão pelo Belgrano em 2022.
Você é nascido numa cidade muito pequena na Argentina. Sua mãe nos contou que você não queria sair de lá. Por que?
— Não gostava de sair de lá. Em Santo Domingo tinha tudo. Lá foi minha infância, tenho meus amigos. Meu povoado para mim era tudo. Você cresce e vai fazendo o seu caminho, mas não queria… Eu tinha teste para jogar no River ou em outro clube. Ia passando os testes, mas eu sabia que não ia embora (risos). Então ficava lá (em Santo Domingo). Depois com o tempo comecei a sair um pouco mais.
Você jogava num clube pequeno lá. Como era?
— Sim, era Union de Santo Domingo. As cores eram branca com a faixa preta. Parecia o Vasco. Quando era criança eu gostava muito de jogar bola. Brincava o tempo todo com a bola, mas num povoado tão pequeno você não tem muita possibilidade de fazer outra coisa. Então a bola para mim sempre foi tudo. Brincava, jogava, fazia todos os esportes. Mas o principal era isso, brincar com meus amigos. Aproveitava muito dos jogos do fim de semana, dos pequenos encontros em outras cidades. A família me acompanhava muito. Tive uma infância muito bonita. Minha mãe é professora de educação física. Ela trabalhava em todas as escolas do povoado. Do Jardim, com crianças pequenas, à escola primária, secundária e terciária.
Ela te dava aula?
— Sim, em todo o tempo. Era bom e não era bom (risos). Porque os professores falavam tudo que eu fazia. Meu pai era caminhoneiro. Mas eu não gostava da profissão dele. Não via graça na profissão porque ele ia muito embora, então eu não podia desfrutar dele. Ele me pedia a todo tempo para acompanhar, mas não gostava muito. Ele era muito trabalhador, eu aprendi muito do que é a responsabilidade com o sacrifício do meu pai e da mamãe, porque foram muito trabalhadores, mas era uma profissão muito difícil porque ele não ficava muito tempo em casa.
Acha que essa distância do seu pai também influenciou para você demorar a sair de casa?
— Depois que a gente cresce a gente começa a analisar tudo e encontra uma razão para esses comportamentos que eu tinha… Acho que pode acontecer. Eu era muito próximo da minha mãe. Meu pai sempre esteve presente, mas é uma profissão que era muito difícil porque ficava muito tempo fora, era algo como um mês fora que a gente não o via. E eu acho que isso que eu não gostei da profissão dele e por isso não quis acompanhá-lo. Eu via que meus amigos tinham os pais todo o tempo com eles, trabalhavam ali no povoado, enquanto ele tinha que viajar. Então acho que hoje me dei conta que eu sofria muito por isso e acho que não gostava de viajar ou de ir embora.
Hoje você é pai e seu filho te acompanha muito. Como é essa relação?
— Meu filho mudou a minha vida. Eu tento ser uma versão melhorada do meu pai, aprendi muito com ele (pai), mas quero melhorar ainda. Antes, depois de um jogo que não era bom, que a gente perdia, que eu não fazia gol, eu ficava muito puto em casa. E agora a gente tem um jogo ruim, volto para casa, olho para ele e passa tudo. Muda o humor. Mas eu não gosto tanto da exposição dele. Acho que ele tem demais (exposição). Aconteceu no Belgrano e aqui a torcida dá muito carinho para mim e para ele. Se a torcida o ama, eu amo a torcida, amo o clube. Mas a gente sai e conhecem muito meu filho. Não gosto muito. Faz parte do trabalho, da profissão, mas muitas vezes tento não expô-lo tanto.
Você chegou há quase um ano, em agosto do ano passado. Parece que não sentiu a diferença da Argentina para o Brasil. Foi fácil a adaptação?
— Foi muito, muito fácil. Eu falo que se a família está bem, eu estou bem. Eu trabalho tranquilo, jogo tranquilo, viajo tranquilo. Chego em casa e a gente não tem problema. É muito difícil quando você está bem no clube e chega em casa e a família não pode se adaptar. Mas se está tudo bem, me dá muita tranquilidade para fazer meu trabalho. Eu falo com eles o tempo todo e eles estão muito felizes aqui, querem ficar por muito tempo.
Mas tudo é diferente. O jogo, a língua, os costumes…
— Eu acho também que quando as coisas vão bem dentro do campo é muito mais fácil. A gente aqui chegou num momento ruim, onde a exigência era muito alta, mas nem todas as experiências são iguais. A princípio o que mais me custou foi o ritmo de jogo, que é muito mais intenso, mais dinâmico. Com o passar do tempo eu fui me adaptando, mas são muitos jogos seguidos. Isso foi o mais difícil, eu tive que mudar muitos hábitos de alimentação, de recuperação, de descanso, mas foi rápido.
Como foi essa negociação para vir?
— Eu amo o Belgrano, acho que foram cinco anos muito especiais para mim, dentro e fora do campo. Com seis meses que eu cheguei ao clube, coloquei a braçadeira de capitão. Joguei a Série B lá, com a exigência de que o time tinha que subir. Foi muito desgastante e eu achava que era um momento legal para sair. Para estar no Belgrano, ser capitão e dar o máximo dentro e fora do campo, eu tinha que ter uma energia muito alta. Eu estava um pouco esgotado de toda essa trajetória que a gente fez no clube. A gente foi campeão, subiu para a Série A, permaneceu na Série A, eu pude sair goleador da Série B e da Série A com o clube.
Pablo Vegetti, atacante do Belgrano — Foto: Divulgação / Belgrano |
— Claro, sempre vão ficar coisas por cumprir, mas eu achava que era um momento para sair, para renovar minha energia, meus objetivos. Foi difícil, mas eu estava muito convencido de sair. A gente começou a olhar outras opções, tinha o América-MG, num momento apareceu o Vasco, depois o Vasco caiu, voltou a aparecer no final da janela. Falei com os dirigentes do Belgrano, falaram um valor, falei para o Vasco. Tudo foi muito rápido. Era o momento de trocar de ares.
Abre Aspas: Vegetti lembra primeiro gol pelo Vasco e momento inusitado na comemoração
Você chegou no fim da semana e já estreou com gol. Você conhecia algum companheiro de time?
— Cheguei quarta e no domingo fui para o jogo. Eu lembro que no gol contra o Grêmio, quando sai a jogada, vem o cruzamento do Pec e eu faço o gol. Eu sou muito de agradecer a quem faz a assistência ou de comemorar o gol com quem faz a assistência. Nesse momento eu não sabia quem era, então foi assim, foi um abraço (faz o gesto e ri). Mas eu não sabia quem era. Foi um momento muito engraçado, porque olhava e não conhecia ninguém.
A sua trajetória mostra um jogador que fez sucesso tarde num cenário de grande clube e, hoje, no principal mercado sul-americano. Por que essa demora em decolar na carreira?
— Hoje eu entendo que tudo acontece por algum motivo. E todo o meu caminho foi indo para que hoje eu esteja aqui, aproveitando o momento. Quando comecei a desfrutar da profissão, quando comecei a desfrutar do trabalho, do dia a dia, do treino, foi quando as coisas aconteceram dentro do campo.
— Eu acho que essa carreira tem muito de psicológico. Os jogadores profissionais não estão preparados para muitas coisas que acontecem. Os jogadores têm que render todo fim de semana. A gente treina, se no fim de semana anterior fez um gol, no próximo tem que fazer dois, três. Tudo tem pressão, tudo tem exigência. Mas tem muita coisa boa que muitas outras profissões não tem.
— Mas a gente não está preparado psicologicamente para tudo que acontece. A mim também foi algo que me prejudicou em alguns momentos, por isso que a princípio tive uma carreira com muitos “vai e vem” e hoje tenho seis anos de regularidade. Mas isso é difícil que muitas vezes os jornalistas ou a torcida entenda. Mas acontece muito. Muitos jogadores que a gente fala: “Por que esse jogador não chegou? Por que esse jogador ficou no caminho, se é um craque, se era…” Mas o futebol, como na vida, é muito psicológico. Se você não está preparado para entender tudo que acontece, é muito difícil. Muito ruim. Então acho que por isso no princípio da minha carreira eu tive esses altos e baixos e hoje tenho regularidade, tranquilidade. Pude conseguir estabilidade dentro e fora do campo.
Abre Aspas: Vegetti reflete sobre saúde mental no futebol
Você faz algum acompanhamento psicológico?
— Minha mulher é psicóloga. A gente precisa ir muito a psicólogo, mas eu não (risos). Eu acho que consigo resolver as coisas sozinho. Tenho meus momentos ruins, mas graças a Deus, eu consigo sair rápido ou resolver sozinho. Quando a gente não consegue resolver as coisas sozinho, é muito difícil, muito. Às vezes parece fácil que eu fale que eu resolvo as coisas sozinho. Há momentos que não são fáceis, que você fica muito ruim, mas se a gente não pode sair, a gente tem que pedir ajuda.
— Hoje, no futebol, tem jogadores que tiram a própria vida, que vivem sob muita pressão, então são situações muito difíceis. Eu acho que acompanhamento psicológico é muito, muito importante. Sinceramente, eu comecei em algum momento da minha vida, mas eu não me sentia cômodo. São muitas exigências, muita exposição que te dá essa carreira. Você tem que estar todo o tempo olhando as críticas, entendendo muitas coisas, escutando muita gente falar merda de você, quando não conhecem você. Tem que saber a que dar importância e a que não dar importância.
Vegetti Vasco Abre Aspas — Foto: André Durão |
Você se refere a críticas, por exemplos, de torcedores na internet?
— Muitas vezes você olha nas redes sociais e quer responder. Eu respondia porque eu sentia que ficava aliviado, mas depois você entende com o tempo que não tem sentido. Você dá importância a alguém que está falando merda de você. Deixa que falem, em algum momento vão cansar. Se você responde é como que mostrar que está acreditando no que ele está falando. Deixa que falem, trabalhe tranquilo, desfrute do trabalho, da família. Depois tente responder no campo. Tentar fazer tudo o que está ao alcance. Se você termina o jogo vazio, se na semana trabalhou bem, descansou bem, se alimentou bem, se recuperou bem, mas no jogo acontecem muitas coisas, não depende de mim. Então se você faz tudo bem em algum momento o trabalho paga.
— Não tem que olhar as críticas, não tem que olhar. Hoje você é o melhor do mundo, amanhã é a merda mais grande do mundo. Não é assim. Eu não acho que sou o melhor, nem o pior. Tento manter equilíbrio dentro e fora do campo. O problema está quando você acredita no que falam. Porque muitas vezes acontece que falam que você é o melhor do mundo e você acredita. É muito ruim para o jogador.
Abre Aspas: Vegetti fala sobre acidente grave dos pais antes de assinatura de contrato
Antes de você ir para o seu primeiro time, com pouco mais de 20 anos, você passou por um drama. O acidente de carro dos seus pais. Como foi isso na sua vida?
— Eu acho que muitas coisas que aconteceram durante esse período, eu as eliminei (da cabeça), não me lembro. Foi um momento muito ruim, também ia acontecer isso de assinar meu primeiro contato como profissional. Aconteceram muitas coisas que eu apaguei da memória. Foi um antes e depois. Esse momento foi ruim, mas hoje entendo que isso, ao longo do tempo, me fez bem. Me fez tomar decisões. Ele me fez ser o que sou hoje. Nesse momento eu sofri muito. Mas hoje eu agradeço, entre aspas, o que aconteceu. Porque eu estou aqui, minha família também. E eu sou hoje o que sou por tudo o que aconteceu no meu caminho. Mas há muitas coisas que nesse momento eu não lembro.
Pablo Vegetti ao lado dos pais, Reinaldo e Alejandra — Foto: Arquivo Pessoal |
Lembra de como recebeu a notícia?
— Algumas coisas pontuais eu lembro. Disso, do momento de receber a notícia, de muitas outras coisas. Meu pai estava em estado muito grave. Teve que ser transferido para Buenos Aires. E ele poderia não resistir a viagem de Santa Fe a Buenos Aires. Depois ficou em Buenos Aires muito tempo e se recuperou. Mas a recuperação também teve muitos problemas, muitas operações. Mas eu acho que nesse momento eu estava também muito convencido do que eu estava fazendo, de que eram minhas últimas oportunidades. E acho que hoje eu sinto que fui um pouco egoísta naquele sentido, porque eu estava muito focado. Também posso analisar que eu teria sofrido muito se eu não estivesse focado. Há muitas coisas que acontecem no caminho, que hoje sendo mais velho ou lembrando, olhando o caminho que a gente percorreu, vai entendendo tudo. Mas foi muito difícil para a família, porque meu pai teve que deixar de trabalhar, minha mãe já estava se aposentando.
Não é comum começar no futebol sem base, com a sua idade. Você pensa nisso?
— Eu achava que não era muito comum, mas se você fala com um ou outro companheiro, vê que acontece. Não é normal, mas acontece mais do que se pensa. Achava que era o único, mas vi que não. Eu joguei futebol toda a minha vida, mas não era profissional. Eu jogava onde queria, não ia para um time profissional porque eu não queria. Mas quando eu quis ir, eu fui. Comecei e deu certo. Essa possibilidade não chega sempre. Ela chegou no momento justo e eu falei: “É agora ou nunca”. Assumi a responsabilidade, depois aconteceu o acidente dos meus pais.
Vegetti Vasco Abre Aspas — Foto: André Durão |
Você chegou a dizer que se arrependia de jogar no Colón, time do seu coração. Por que?
— Eu estava no Gimnasia de La Plata e chegou a proposta do Colón. Para mim era realizar um sonho. Decidi com o coração, mas não decidi com a cabeça. Tomei a decisão de cabeça quente. Não me arrependo, mas se pudesse voltar um tempo atrás eu teria pensado de outra maneira. O clube estava muito ruim, havia subido para a primeira divisão há seis meses, muitos problemas políticos e, quando chegou a proposta, não analisei. Eu também cometi muitos erros. Não era o jogador e a pessoa que sou hoje. Foi uma decisão um pouco rasa, mas eu realizei o sonho de vestir a camisa do Colón. Isso para mim foi muito importante, mas o momento não era aquele.
Você jogou nas três divisões da Argentina. O que passou por lá?
— Eu joguei na terceira divisão um ano, fomos campeões, o clube subiu e fui embora. Depois joguei a B Nacional, saí campeão com o Belgrano, a gente subiu e fui embora. Muitos dos times que joguei na terceira divisão hoje estão na segunda e os da segunda estão na primeira. Nos campos que eu jogava ontem muitos jogadores da primeira divisão estão jogando agora. Uma loucura isso. Joguei campeonatos regionais, tipo um Carioca, foram muitas coisas que me ajudaram a aprender e a crescer.
— Eu sou o único jogador na Argentina que foi artilheiro das três divisões e também da segunda e da primeira de forma consecutiva. Isso me ajudou a crescer e ser o jogador que sou hoje.
O que foi determinante para sua regularidade nos últimos anos?
— Eu estava no Gimnasia de La Plata, fiquei oito meses sem jogar. Eu joguei um jogo em janeiro e voltei a jogar em setembro. Eu tinha contrato com o clube e ninguém me falou que eu não estava nos planos do treinador. Eu quis ficar porque em janeiro, na pré-temporada, fomos fazer um jogo fora de La Plata, eu joguei, fiz gol e achei que ia ter oportunidade. Depois desse jogo, o treinador me tirou, nunca falou comigo e fiquei treinando separado. Fiquei puto com a situação, com o clube também, eu tinha mais um ano e meio de contrato. Na janela de julho, o clube disse que queria rescindir o contrato, eu aceitei, mas queria que cumprissem com o pagamento do contrato todo. Estava puto por estar parado há tanto tempo, sem ninguém falar comigo.
— Tinha possibilidade de ir a um clube da primeira divisão, mas eu queria que o clube me pagasse tudo. Hoje também me arrependo disso. Acabei saindo do clube, o mercado da primeira divisão havia fechado e o da segunda divisão fecharia em uma semana. Fiz a rescisão e fui jogar a segunda divisão por um clube do interior, Boca Unidos de Corrientes. Eu falei: “Ou morro aqui ou volto a nascer”. Era um clube muito pequeno, sem torcida, acabou caindo para a terceira divisão, mas eu fiz um segundo turno muito bom, com 12 gols, mas quando cheguei o clube já estava numa situação ruim. Falei para mim: “É agora ou tenho que deixar o futebol”. Tive resiliência. Depois veio o Instituto, fiz 15 gols, fui artilheiro, fui para o Belgrano e aconteceu tudo.
O que levou desse caminho?
— A vida do jogador de futebol é resiliência, trabalho o tempo todo, é como a vida. Na vida não está tudo bem em todo momento e no futebol também não. Aqui no Vasco mesmo há um mês ou mais estava tudo ruim, e hoje estamos no melhor momento desde que eu cheguei. As coisas mudam o tempo todo. O que tem que fazer é hoje. O treino de hoje, de amanhã, o jogo depois. Não podemos ficar nem no bom nem no ruim. Se eu faço dois gols hoje, eu não posso me apegar a isso. Se eu errei dois gols hoje, também não posso ficar com isso. Tem que seguir o caminho, como na vida.
As caras e bocas de Vegetti em entrevista no Abre Aspas — Foto: André Durão |
Você se tornou capitão do Vasco. Como ganhou a confiança dos jogadores?
— Primeiro de tudo tem que ser uma boa pessoa. Isso é fundamental. Para que as coisas aconteçam dentro do campo e dê tudo certo, a gente tem que formar um bom grupo. Quando eu cheguei, eu vi que o grupo não estava bem, que havia muita diferença entre os jogadores estrangeiros e os jogadores do Brasil. Eu falei: “Estamos todos juntos, ou nos salvamos todos ou morremos todos”. Não tenho problema com ninguém, falo com todo mundo, brinco com todo mundo.
— Não dá para ser amigo de todo mundo, mas tem que ter uma boa relação no trabalho, pensar em conjunto, e isso eu acho que hoje mudou muito, se vê dentro de campo. Acho que também por causa da minha personalidade, por como me comporto dentro do grupo e dentro do campo. Falar é fácil, mas tem que fazer conexões, isso é minha personalidade, brinco muito com todos. Os brasileiros gostam muito disso. Havia grupos diferentes e isso não era bom. Não tinha problema, briga, mas eu falava que tínhamos que estar todos juntos.
E de onde saíram esses tapas nos jogadores contra o São Paulo?
— Saiu no momento (risos). Depois eu vi que saíram muitas notícias, mas foi um momento de muita felicidade, não me contive. Deu certo, vou voltar a fazer (risos).
Vegetti brinca sobre tapas em jogadores do Vasco: “vou voltar a fazer”
Foi uma forma de motivar?
— Eu não era capitão, agora sou, mas tento ser o mesmo de sempre, não muda nada. Sei que é uma responsabilidade grande usar a braçadeira em um clube como o Vasco, mas sou o mesmo de sempre. Esse momento aconteceu, não pensei em dar tapa na cara, aconteceu. Foi um jogo muito bom para nós, começamos a jogar melhor e deu certo. Futebol é resultado. Se eu desse os tapas e o São Paulo virasse, iam dizer que os tapas não foram bons.
No Abre Aspas, Vegetti cita os três melhores atacantes do Brasil atualmente
Quem você elege como os três melhores atacantes do Brasil?
— Tem o Estêvão. É um jogador que tem muito futuro. Mas não é minha posição. Na minha posição, acho que, por números, o Pedro está tendo um ano muito bom. Depois, acho que o Lucero também está fazendo um grande ano no Fortaleza. Tem muitos, não quero esquecer de nenhum. Acho que, hoje, o futebol do Brasil tem um nível muito alto. Você encontra jogadores de muito nível, mas acho que esses dois caras hoje estão muito bem, seus times estão bem também. Vemos o Calleri fazendo o que está fazendo no São Paulo. Cano também, mas o Fluminense agora não está passando por um bom momento. Mas é um jogador que tem características que eu gosto muito, é muito goleador, muito intuitivo.
O pequeno Pablo Vegetti com a camisa da Argentina e a bola nos pés — Foto: Arquivo Pessoal |
Você está nesse bolo?
— Não sei se estou ou não estou nesse grupo. Tento fazer o melhor para o Vasco, para que a gente volte a ter um clube no nível que merece, que o clube merece, que a torcida merece. O que eu encontrei aqui foi um clube muito popular, com uma torcida incrível. Então a gente merece mais, o time merece mais. Acho que hoje estamos conseguindo. A gente não tem que sofrer, tem que pensar em brigar por coisas muito importantes. Mas isso não acontece de um momento para outro. Isso acontece com muito trabalho. Na verdade acontece quando você também tem uma estrutura forte. Acho que o Vasco está começando a ter isso.
— Eu falo que um time grande como o Vasco não pode ter estrutura deficiente. Para que um clube como o Vasco brigue por títulos todo o tempo, tem que ter uma estrutura forte. Hoje estamos vendo isso, estamos trabalhando muito. O Pedrinho passa uma imagem que era muito necessária para nós, agora com a vinda do Philippe… Estamos vendo outra coisa no clube. Mas a gente tem que seguir melhorando. Aprovaram o estádio novo, que vai ser muito importante para o clube. Tomara que eu possa jogar nele algum jogo também (risos). O que se vê no Vasco hoje é muito bom, mas tem que começar a construir aos poucos. Não vamos começar a falar agora que vamos ser campeões de tudo porque estaríamos falando mentira. Tem que começar a brigar por coisas importantes. Mas a estrutura do clube tem que crescer junto. Você não pode falar que vai sair campeão de tudo, e a gente não melhorar as coisas que têm que melhorar.
Qual zagueiro mais difícil de enfrentar?
— Cara… Não tem jogo fácil. Eu falo para os meus amigos na Argentina: estou muito surpreso com a liga brasileira. Eu gosto muito, demais, de tudo. Desfruto de cada jogo, de cada estádio que jogamos, é uma liga muito top. A intensidade nunca abaixa. Eu dizia que, na Argentina, você tem jogos em que fala: “Esse jogo vai ser mais tranquilo, a gente vai poder respirar”. Não, aqui é o tempo todo ao máximo, todos os jogos a gente termina extenuado. Se você relaxa com qualquer time, pode perder. Tem zagueiros de muito nível. Aqui os zagueiros são muito mais rápidos do que na Argentina, muito mais fortes. É como falei no caso dos centroavantes, (se eu esquecer) estaria falando mal de alguém. Mas o jogo em que eu mais sofri até agora foi o jogo contra o Bahia, lá, no ano passado. Quando a gente empatou em 1 a 1. Nesse jogo, eu falei com a comissão técnica anterior, com Ramón e Emiliano, que nesse jogo eu sofri muito. Não sei por que, mas lembro que esse jogo para mim foi muito ruim.
Afinal, o que aconteceu no vestiário depois da derrota para o Criciúma? Ramón pediu demissão?
— Foi um momento difícil. Acho que foram acontecendo muitas coisas que não eram boas para o clube, para o que a gente estava vivendo. Nesse momento, havia muitas dúvidas de tudo, eles se encarregavam de tudo que acontecia aqui dentro. Ninguém esperava que eles fossem embora do clube, então foi muito difícil, teve um impacto muito grande para o time. Porque eles têm uma relação muito boa com os jogadores, muito próxima de nós no dia a dia. Mas eu falo que, se eles contassem com a estrutura que o Vasco hoje está montando, as coisas dariam muito mais certo. Hoje eles estão no Corinthians, fazendo um novo trabalho, um novo processo. Para nós, esse momento foi muito ruim. Depois houve muita troca de “manager” também, veio o Rafael, que fez coisas muito boas. Vai embora o Rafael, vem o Álvaro Pacheco. Tudo que aconteceu com ele. Todos os problemas com a 777. Então aconteceram muitas coisas que também nos afetaram.
— Não é uma desculpa, mas é muito difícil para nós fazer as coisas bem dentro do campo, quando escuta muitas coisas que vão acontecer. O time sempre se blindou ao máximo em cada treinamento, com o treinador que fosse. Quando se falava mal de alguém, era muito doloroso. Mas o que acontecia aqui dentro era muito ruim, muita instabilidade. E hoje se vive tudo o contrário. Rafael está fazendo um trabalho enorme, impressionante, com muita humildade, muito trabalho. É um cara muito legal. Como a gente falava ontem com o comando do Pedrinho e todo o estafe, acho que tudo isso está mudando, mas não vai ser fácil, como falei. Tomara que sim, que a gente saia campeão amanhã, mas seria muito difícil. Mas temos que começar a mudar para poder conseguir esse tipo de coisa.
Você tem um cabeceio muito forte. Qual o segredo?
— Ah, eu quero que todas as bolas cheguem na área. Eu fico muito puto quando a bola não chega. Mas eu entendo também que a gente não pode ficar o tempo todo colocando bola na área. Mas acho que é uma característica, é algo como uma virtude que eu tenho. Não sei como explicar. É o meu trabalho, é algo que está no meu jogo. Mas os zagueiros também começam a conhecer o movimento, então eu tenho que tentar fazer algum outro movimento para me desmarcar. Mas é uma característica muito boa que eu tenho e tento resolver dentro da área. Eu digo que sei que eu faço um esforço enorme, tenho muito desgaste físico no jogo ajudando o time.
— Eu digo que gostaria de ficar o tempo todo dentro da área, que é o meu lugar de conforto. Mas a gente, para ajudar o time, tem que sair da zona de conforto e fazer outro tipo de trabalho. Mas é uma virtude que eu tenho, que eu tento aproveitar. É uma condição de intuição, de goleador. E se eu explico, perde a magia (risos).
Você até deu bronca, brincando com o Leandrinho, que não cruzou bola para você e chutou…
— (risos). Claro, o Leandrinho é um jogador que tem muito futuro. Mas, se ele não cruzar, vai embora (risos). Eu quero que todas as bolas cheguem na área. Não só cruzamentos, mas fazendo uma tabela. Acho que o time está crescendo muito. Mas temos um recurso muito bom que são os cruzamentos. A gente fala “gol de play station”, ir para fora e cruzar. Se você vê muito futebol europeu, a maioria dos gols é assim, cruzando. Depois tem muitas outras alternativas. Mas eu quero que todas as bolas cheguem na área, fico muito puto quando não chega, mas faz parte. Mas estamos fazendo um trabalho muito bom e acho que vai dar certo, se a gente seguir por esse caminho, trabalhando. E se a gente seguir nesse caminho a nível de clube, com essa estrutura, com o apoio que estamos tendo com o Pedrinho e seu estafe, a movimentação que estão fazendo na janela, acho que as coisas que virão vão ser muito boas para o Vasco.
Você tinha sonhos quando era menino. Tinha um ídolo, talvez sonhasse com a seleção argentina. Quais são os seus sonhos hoje?
— Eu falo que nasci na geração errada. A de 1988 tem os melhores atacantes da Argentina (risos). Mas pensar em jogar pela seleção sempre esteve muito longe para mim. Meu ídolo era o Batistuta. Eu o acompanhava muito, gostava muito. Via os jogos da Fiorentina, da Roma. Mas depois, maior, a gente vai vendo atacantes diferentes, tenta fazer sua versão pessoal. Não é bom copiar ou imitar, mas eu olho muito para tentar imitar diferentes coisas, tirar coisas boas de diferentes jogadores e tentar imitá-las. Se eu voltar no tempo e lembrar o que queria fazer, quando era menino sempre quis ser jogador profissional. Acho que eu não visualizava o momento que estou vivendo hoje, a carreira que eu fiz, acho que tudo foi acontecendo. Mas o tempo todo eu agradeço pelo que o futebol me deu, que a vida me deu. Mas sou um cara que nunca se conforma, que sempre quer ir por mais. Acho que é isso que faz com que eu cresça, que eu queira mais todo o tempo, que queira ganhar sempre. Se você me pergunta hoje, acho que (o futebol) me deu mais do que eu sonhava naquele momento.
Fonte: ge